Monthly Archives: Outubro 2014

Prémio António Quadros 2014 atribuído a «Nunca Digas Nunca»

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A obra é de Lara Xavier com ilustrações de Raquel Pinheiro, editada em 2012 pela Texto Editores. Foi ainda atribuída uma Menção Honrosa a Este Livro está a Chamar-te (Não Ouves?), de Isabel Minhós Martins, com ilustração de Madalena Matoso, da Planeta Tangerina.

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A cerimónia de entrega dos prémios acontecerá na Fundação António Quadros, em Rio Maior, no próximo sábado, dia 25 de outubro, às 15h30.

Mais informações aqui.

O mundo fantástico de Nicoletta Ceccoli

por Ana Ramalhete
Nicoletta e a ilustração

Nicoletta Ceccoli nasceu em 1973, em São Marino, onde vive e trabalha como ilustradora de livros. Formou-se no Instituto de Arte de Ubino e já ganhou vários prémios, como o Prémio Andersen para o melhor ilustrador, em 2001, a Medalha de Prata da Sociedade do Ilustrador de Nova Iorque e o Prémio de Excelência de Comunication Arts 2002. O seu trabalho tem sido exibido em vários países, tais como França, Canadá e Estados Unidos da América, onde faz exposições regularmente. Já esteve presente na Feira Internacional do Livro Infantil de Bolonha sete vezes.

Nicoletta começou a interessar-se por ilustração na escola. Iniciou os seus desenhos com formas redondas e temas fantásticos e sentiu necessidade de criar imagens a partir de uma história.

As suas ilustrações são executadas a lápis, pastel e acrílico. Mais recentemente começou a experimentar o computador e o spray. Têm, quase sempre, como figura principal, uma menina que interage com as outras figuras. Esta ligação é estabelecida através de pormenores que se complementam, como um laço na cabeça com pássaros iguais aos que saem de uma saia/ovo, ou como uma boneca animada que não tem pescoço e tem a cabeça separada do corpo para adquirir o movimento dos objectos que a rodeiam.

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Algumas lembram bonecas de porcelana, outras figuras surrealistas onde há uma mistura do humano com animal ou vegetal. Algumas têm cabelos que são árvores, corvos ou peixes, outras, corpos que são ovos, patas de aranha ou gaiolas com pássaros. Como a própria Nicoletta afirma (em entrevista dada à revista Backmagazine), são raparigas abandonadas em espaços vazios, frequentemente em situações perigosas ou assustadoras e representam-na a ela e aos seus medos.

Estas meninas são intensas, comoventes, por vezes melancólicas. Existem numa atmosfera de sonho. São encantadas, delicadas, inquietantes. Contam histórias e parecem saídas de contos de fadas.

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Nicoletta Ceccoli constrói estas ilustrações a partir de temas, sendo os mais recorrentes os brinquedos, as bonecas e os contos (de fadas ou outros). Neles encontramos elementos figurativos que se repetem: os objectos, onde se incluem botões, dados, bolas, gaiolas, bengalas, cavalos com rodas (alusões aos brinquedos antigos de lata); os animais, tais como borboletas, escaravelhos, pássaros, peixes, ratos, elefantes, coelhos; as torres (com cúpulas que recordam carrosséis ou tendas de circo) e os castelos; as árvores e os ramos; as rodelas com espirais parecidas com guloseimas, chupa-chupas ou rebuçados; as nuvens; o chão com mosaicos aos quadrados e os animais voadores.

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Há uma nítida citação do universo da infância, dada através da representação de brinquedos semelhantes aos antigos, de ferro ou de lata, a brinquedos de plástico dos anos sessenta e setenta e a bonecas. Alguns são inspirados na sua colecção de bonecas partidas e brinquedos que guarda na sala onde trabalha, em sua casa.    As torres, que pinta, são executadas com base nas torres da cidade de São Marino, nomeadamente a Torre de Gaíta que serviu de inspiração para as ilustrações das «meninas na torre». Algumas imagens são criadas com a perspectiva das três torres.

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Influências e inspirações

Em todo o trabalho desta ilustradora encontram-se influências de pintores de variadas e distintas épocas.

De Yeronimus Bosh (1450-1516), nas figuras estranhas que se compõem de partes diferentes: animais com características humanas ou humanos com características animais; nos peixes voadores; nas figuras a pairar no céu; nas serpentes ameaçadoras e nas meninas que montam animais de diferentes espécies.

De René Magritte (1898-1967), nos objectos vulgares que fora do contexto ganham novos significados; na linguagem onírica povoada da simbologia e da forma narrativa dos sonhos; nas figuras das nuvens; nas cabeças separadas do corpo; nas maçãs que surgem a flutuar; no contraste entre o tratamento realista dos objectos e a atmosfera irreal dos conjuntos.

De Mark Ryden (pintor norte-americano nascido em 1963), nas meninas semelhantes a bonecas; em alguns elementos como os animais que servem de meio de transporte e nas cores pastel que contribuem para criar uma atmosfera fantástica e surreal. Também outros artistas de cunho surrealista como Remedios Varo (1908-1963), Ray Cesar ( Londres,1958) ou Stasys Eidrigevicius (artista que nasceu na Lituânia e vive na Polónia) são fonte de inspiração e de admiração confessa de Nicoletta Ceccoli.

Encontramos também no trabalho de Ceccoli outras influências, quer de artistas plásticos como os pintores renascentistas (nas cores utilizadas como os tons pardos e acinzentados que acentuam o lado secreto e misterioso), quer de outras áreas como: o desenho animado (nomeadamente os Quay brothers); o cinema (de Fellini, Tim Burton; David Lynch, entre outros); os livros (Dickens, Lewis Carrol, Kurt Vonnegut).

Tal como Bosch e os pintores surrealistas o fizeram, Nicoletta desperta o nosso interesse pelo mundo dos sonhos, através de imagens fantásticas, aparentemente irracionais, carregadas de metáforas e simbolismo, estabelecendo um contraste entre o tratamento realista dos objectos e a atmosfera irreal dos conjuntos.

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As figuras e os livros de Nicoletta

O trabalho de Nicoletta é inovador, original, interessante e atraente. As figuras e o ambiente fantástico que o caracterizam levam-nos até ao seu mundo, onde coabitam a delicadeza e a inquietude, a ternura e o insólito, as paisagens encantadas e as paisagens fantásticas, exactamente como nos contos que fascinam as crianças. Estas são levadas a voar, a imaginar e a entrar nas histórias que as imagens lhes contam. Certamente se sentirão identificadas com toda a fantasia e reminiscências inerentes às suas vivências e gostarão de olhar para as imagens deixando-se flutuar nelas e com elas.    Esta ilustradora italiana publicou mais de trinta livros, desde 1995, em vários países, tais como: Itália, Reino Unido, Estados Unidos da América, Tailândia, Suíça e França.    Em Portugal estão publicados apenas três livros. São eles: O Atlas de Ana (2003, Livros horizonte), O desejo do lenhador (2003, Livros Horizonte) e As aventuras de Pinóquio (2003, Presença). As ilustrações destes livros não se assemelham às imagens das meninas. Têm cores mais vivas, mais fortes e as figuras humanas não têm aspecto de bonecos. É uma outra vertente do seu trabalho, que coexiste pacificamente com o outro lado mais sombrio e esfumado e também mais característico, aliciante e inovador. O mundo de Nicoletta Ceccoli tem algo de secreto, misterioso e fantástico.

Bibliografia

Bazin, Germain, História da Arte, Bertrand, Lisboa, 1976
Eco, Umberto, História do feio, Difel, Lisboa, 2007
Janson, H. W., História da Arte, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1977
www.nicolettaceccoli.comwww.markryden.comwww.arrestedmotion.comwww.raycaesar.comhttp://eidrigevicius.comwww.bakmagazine.com.

Leituras do baú – «O Clube das Chaves»

por Alexandra Martins

Quando era pequena, devorava todas as coleções infanto-juvenis que houvesse. E havia tantas. Uma das que melhor me lembro é a d’O Clube das Chaves. Da autoria de Maria Teresa Maia Gonzalez e Maria do Rosário Pedreira, esta é uma coleção composta por 21 livros, cada qual com uma história individual.

Tudo começa no dia em que o Pedro faz treze anos e recebe um presente muito especial: uma caixa do Avô Cosme, um homem misterioso e muito culto que era o ídolo do Pedro e que tinha falecido recentemente. Dentro da caixa está um conjunto de chaves, cada qual com um enigma e uma aventura por viver. O desafio que o Avô Cosme lhe lança é o de desvendar cada mistério, um de cada vez e por ordem, descobrindo onde pertence cada uma das chaves.

O Pedro, receoso de não conseguir levar a cabo uma demanda de tal envergadura sozinho, decide então criar a O.R.D.E.M. (Organizacão para a Resolução e Descodificação de Enigmas e Mistérios, Lda.) da qual fazem parte o seu melhor amigo Frederico, a sua irmã Anica e a sua prima Guida. São eles o Clube das Chaves. De fora do clube ficam os primos André, mais velho e com outros problemas para resolver, e Vasco, mais novo e muito inteligente, que se ressente por não ter sido convidado para integrar o grupo. Sentindo-se excluído, Vasco transforma-se no Fantasma da O.R.D.E.M., com o objetivo de resolver cada mistério antes dos outros sem que eles descubram quem ele é.

Em todos os livros, uma ilustração das personagens principais. Da esquerda para a direita: Frederico, Pedro, Anica, Guida, Vasco e André.
Em todos os livros, uma ilustração das personagens principais. Da esquerda para a direita: Frederico, Pedro, Anica, Guida, Vasco e André.

É à volta destas cinco personagens e das suas famílias e amigos que gira a história, sendo cada livro dedicado à resolução do enigma de uma chave. Umas vezes a O.R.D.E.M está à frente, outras é o Fantasma, enquanto vão vivendo aventuras, crescendo, aprendendo, desabrochando para a adolescência e a idade adulta, com tudo o que isso implica – romance, amizade, problemas, decisões que vão ter de tomar.

Para mim, um dos pontos altos desta coleção é este crescimento, que quase acompanha o leitor. Ao contrário de séries como Os Cinco ou Uma aventura em que as personagens são eternamente jovens, aqui vê-se um crescimento e um amadurecimento por parte de todas as personagens, além de se aprofundarem feitios, sentimentos e atitudes. O Pedro, a Anica, o Fred, a Guida, o André e o Vasco do primeiro livro são diferentes dos do último, tornando os livros ainda mais reais e próximos dos leitores, que se identificam com algumas das situações que surgem, como o primeiro amor, as zangas de família, os problemas na escola, as opções difíceis que às vezes todos temos de tomar.

A coleção, editada pela editora Verbo, termina no número 21, com a última chave e um título deveras apelativo: O Clube das Chaves agarra o fantasma, lançado no ano 2000. Em 2005, a coleção foi adaptada a série televisiva, com 21 episódios (um por cada livro) emitida na TVI, e os livros tiveram direito a novas capas, com as imagens da série. Pessoalmente, gostava mais das primeiras capas.

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Capas originais

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«Corta com a Violência»

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Hoje assinala-se o Dia Mundial do Combate ao Bullying, e a frase do título é o slogan da campanha da APAV para alertar «para a importância de todos favorecermos relações saudáveis entre pares».

Aproveitamos para deixar aqui alguns livros que podem ajudar as crianças a compreenderem o que é o bullying e a evitá-lo, tanto como agressores, tanto como vítimas.

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Vasco das Forças, Maria João Saraiva de Menezes, Coisas de Ler

«O termo bullying, traduzido do inglês, compreende as múltiplas formas de violência física e/ou psicológica intencionais e repetidas, praticadas entre pares por um individuo (bully) ou um grupo (bullies) que ocorrem sem motivação evidente, causando sofrimento profundo às vítimas, e sendo executadas no contexto de uma relação desigual de poder. É desta relação desigual que nos fala Maria de Menezes, ao retratar as aventuras do menino Vasco, neste actualíssimo livro. O Vasco ao ser confrontado com colegas mais velhos, mais altos e mais fortes, que um dia o começaram a agredir e maltratar, deixou de gostar de ir para a escola. (…) Cabe aos pais e professores promover um clima positivo e ajudar as crianças a encontrar estratégias para voltarem a ser livres para viver e aprender. É este encontro com a esperança que o espera ao ler este livro. O Vasco reencontrou-se e ajudou os outros a mudar. A escola era novamente um lugar para continuarem a ser felizes.»

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Uma Questão de Azul Escuro, Margarida Fonseca Santos, Gailivro

«Margarida Fonseca Santos, em Uma questão de azul-escuro, aborda de uma forma bastante sensível e intimidativa um tema muito actual, o Bullying, que é um comportamento consciente, intencional, deliberado, hostil e repetido, de uma ou mais pessoas, cuja intenção é ferir os outros.
Luís é um menino do primeiro ciclo que, um dia, ao passar no Beco da Agonia, um local pouco iluminado, foi surpreendido por dois rapazes mais velhos que o agrediram, deixando-lhe o corpo cheio de manchas azuis.
Toda a história se desenrola a partir do momento em que a professora de ginástica descobre…»

E para os pais:

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Tenho Medo de Ir à Escola, Tânia Paias, Esfera dos Livros

Identifique os Sinais de Bullying e Cyberbullying. O seu Filho é Vítima ou Agressor?

«Como educar os nossos filhos para se tornem crianças seguras, resilientes e confiantes? Como treinar o seu olhar para a diferença e para a tolerância pelo outro? Estes são os primeiros passos para que o seu filho não se torne nem vítima nem agressor. E não, não acontece só aos outros. Em Portugal as estatísticas revelam que cerca de 40 por cento dos nossos jovens já se envolveu em alguma dinâmica bullying, tanto no papel de vítima, como de agressor. Mas afinal o que é o bullying? A psicóloga Tânia Paias, especialista neste tema e fundadora do Portal Bullying, explica: é um fenómeno de violência na escola que se traduz em comportamentos agressivos, intencionais e repetitivos, levados a cabo por um ou mais alunos contra outro. Não é um fenómeno de hoje, e as novas tecnologias de informação e a Internet abriram caminho a um outro tipo de violência que já não se passa apenas no recinto escolar, mas sim através de mensagens instantâneas ou por e-mail: o cyberbulling.»

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Violência nas Escolas – Bullying, Nazaré Barros, Bertrand Editora

«Em Portugal, ouvimos cada vez mais falar de educação e de escolas, nomeadamente na comunicação social, mas nem sempre pelas melhores razões. Tempos difíceis e agitados, em que alunos se agridem uns aos outros, alunos agridem professores, professores agridem alunos, pais agridem professores, fenómenos de indisciplina e violência na escola, aparecem nos meios de comunicação social. Conflitos, agressões, roubos, queixas feitas na escola e na polícia, segurança reforçada, equipamentos de vigilância electrónica, cartão electrónico do aluno, escolas fechadas com grades e muros, que fazem lembrar prisões e até há quem peça detectores de metais à porta da escola. Para onde caminhamos? O que é, afinal, esta vivência conjunta? No horizonte permanece o desejo e a utopia de uma Escola menos violenta, menos agressiva, menos indisciplinada e plena de entusiasmo face às aprendizagens. Com esta utopia, vos convidamos a sonhar. Para esta utopia, vos convidamos a caminhar.»

Abrir uma livraria por paixão e razão, sem crises.

por Catarina Araújo

aqui apresentámos a livraria infantil e juvenil Fadas, Bruxas e Dragões, de Benavente. Entretanto, falámos um bocadinho com os proprietários, que iniciaram em 2013 um verdadeiro negócio de família, juntando um «”pai”, Pedro Peralta, 42 anos, vindo da área dos números, das faturações e das contas, com uma “mãe” jornalista, Ana Mafalda Ganhão, com 45, os dois rendidos aos livros e com muita vontade de apostar num projeto comum.»

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A paixão pelos livros levou-os a correr o risco em plena crise, porque por vezes é na crise que se encontra a inspiração e a força para ir mais longe. Ambos mantêm os seus empregos, pelo que, como nos conta Mafalda Ganhão, «as “Fadas” são um esforço extra-laboral, que envolve ter alguém a tomar conta da loja, muita ajuda familiar e até a colaboração das nossas duas filhas, grandes entusiastas, críticas moderadas e às vezes também “mão-de-obra” de recurso, nas horas de aflição.»

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(c) Fadas, Bruxas e Dragões

Numa jigajoga que certamente não será fácil, a parceria é fundamental e Mafalda admite: «Tenho a tendência de fugir para as nuvens ou acordar com ideias repentinas, que nem sei como concretizar, o Pedro é muitas vezes a voz da razão, o executor paciente e o complemento racional que faz falta para o equilíbrio não se perder… »

Apresentem-se!
A «Fadas, Bruxas e Dragões» é uma livraria infanto-juvenil, aberta há menos de um ano em Benavente, em pleno Ribatejo (mas pertinho de Lisboa), onde os livros são as estrelas, ainda que a casa tenha também uma pequena cafetaria, venda brinquedos didáticos e promova várias atividades educativas. O nosso lema diz quase tudo: «Brincar com as histórias, crescer com os livros».

Porque resolveram abrir uma livraria infantil e juvenil?
A livraria nasceu da absoluta necessidade de dar corpo a uma ideia que morava há tempo de mais só na cabeça e em imensas folhas de rascunho, como projeto. Há fases na vida em que é preciso arriscar, perder o medo e ir à luta, apesar das crises ou das recomendações para ter cautela. Nasceu da preocupação com os baixos índices de leitura – particularmente entre os jovens – e da vontade de dar a conhecer os nossos maravilhosos autores e ilustradores, tal como as muitas obras infanto-juvenis que «escapam» às prateleiras das grandes superfícies. Em suma, nasceu do desejo de partilhar o prazer que é a leitura.

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(c) Fadas, Bruxas e Dragões

Como conceberam o espaço?
A casa onde se instalou foi um feliz acaso do destino: antiga o suficiente para ter memórias (com um sótão que um dia destes se vai transformar num cenário de sonho para as histórias) e em frente a uma escola do ensino básico, que nos faz ter por perto as crianças. Ser quase uma salinha de estar, acolhedora como as nossas casas e sem cair nas cores berrantes, só por ser para os mais novos, foram as linhas da decoração. Depois ganhou forma naturalmente, como um puzzle que se encaixa. Foi o que deu estar há tanto tempo pensada… Ideia fundamental? Ser agradável para qualquer faixa etária, com boas energias.

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(c) Fadas, Bruxas e Dragões

Como tem sido a receção das pessoas?
As pessoas são muito simpáticas e elogiam o espaço. Sobretudo, sentimos que as crianças se sentem bem aqui dentro, o que representa a maior conquista. A livraria tem um conceito um bocadinho diferente, novidade em relação à vila onde se insere, por isso no início também notámos alguma estranheza: «É um café? Uma livraria? As duas coisas?» Mas aos poucos cresce o número de clientes fiéis, o número de «amigos» no Facebook, e vamos recebendo muitas mensagens de encorajamento.

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(c) Fadas, Bruxas e Dragões

Que atividades desenvolvem?
Temos atividades pagas e atividades gratuitas. A filosofia é que não seja pago tudo o que aconteça no horário comercial normal, como horas do conto (há sempre, ao sábado de manhã), eventuais apresentações de livros, etc. As propostas que requerem inscrição são várias e variam mensalmente. Muitas estão ligadas à promoção da leitura, mas não só. Por aqui se fazem ateliês de fotografia, ciclos de cinema de animação, tardes de culinária… e tudo o mais que a imaginação ditar.

Também é intenção da livraria trabalhar com as escolas e a comunidade, daí que sair da loja seja outra vertente. Para ir contar histórias, para organizar Feiras do Livro… estamos sempre à espera de receber desafios.

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(c) Fadas, Bruxas e Dragões

Sentem-se como missionários da leitura?
Ui! Missionário talvez soe pomposo e se afaste daquilo que realmente nos sentimos, no sentido em que só queremos mostrar que ler é bom, e faz bem. Como não conhecemos melhor forma de o demonstrar, fazemos por dar o exemplo. Por aqui lê-se muito.

E agora recomendações de leitura para esta época: de infantil e de juvenil.
Para todas as épocas: Os livros que devoraram o meu pai, de Afonso Cruz, e, para os mais pequenos, o recém-lançado O Escuro, de Lemony Snicket, com ilustrações de Jon Klassen. Para os leitores «em transição», a meio caminho entre o infantil e o juvenil, não resisto à personagem Clementina, criada por Sara Pennypacker – a coleção tem três títulos e são todos muito divertidos.

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E que tal um convite aos nossos leitores?
O óbvio convite para nos visitarem. Adoramos ter a casa cheia e as “fadinhas” ficam sempre felizes quando aparecem amigos novos. Gostamos que nos falem de livros que ainda não conhecemos, que nos contem quais são os vossos preferidos e que nos tragam ideias para fazermos coisas novas. Os fãs da internet que nos desculpem, mas para este efeito o mundo virtual sabe a pouco. Apareçam!

Anunciado o vencedor do Prémio Literário Maria Rosa Colaço 2014

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Viagens de Chapéu – As Invenções e Indecisões de Dona Amélia Longor, de Susana Margarida Cardoso Fernandes Ferreira, é o original galardoado com o Prémio Literário Maria Rosa Colaço 2014, este ano atribuído a obras de literatura juvenil.  Nesta história, Baltazar Porventura e Ema Mordente são dois jovens que ao colocarem na cabeça um certo tipo de chapéu são transportados numa viagem alucinante até uma estranha ilha onde vive alguém incapaz de tomar uma decisão. A autora, que atualmente trabalha como tradutora, já tinha dois livros publicados na área do infantil. O vencedor recebe, além da distinção, um prémio no valor de cinco mil euros.

Via Diário Digital.

Apelo de uma leitora que pede mais personagens com deficiências

(c) Emily Drabble. Megan com a autora  Malorie Blackman.
(c) Emily Drabble. Megan com a autora Malorie Blackman.

A leitura ajuda a formar, a desenvolver, a entreter, tão essencial para o desenvolvimento como comer bem, fazer exercício, ir à escola, brincar. Deste modo, tenta-se fomentar o gosto pela leitura encontrando histórias com que os pequenos leitores se possam identificar. O problema é quando essas histórias não existem. O problema é quando essas crianças sofrem de algum tipo de deficiência física ou mental, e tudo o que encontram são histórias de heróis ou heroínas atléticas. Num artigo escrito para o jornal The Guardian, Megan, uma leitora americana confinada a uma cadeira de rodas, faz um apelo para que os escritores introduzam mais personagens com deficiências ou com necessidades especiais nos seus livros de ficção, que se «atrevam» a ter como protagonistas heróis ou heroínas amputadas ou com dificuldades motoras, refletindo nas histórias a diversidade de crianças existentes no mundo real para que todas tenham oportunidade de se sentirem identificadas com uma personagem que lhes pode dizer muito. Aqui fica o texto reivindicativo desta leitora (em inglês).

Gostaríamos muito de fazer uma lista de livros deste género para recomendar aos nossos leitores, pelo que apelamos a que nos enviem informação sobre livros infantis e juvenis editados em Portugal que conheçam e que contenham personagens com algum tipo de deficiência ou necessidade especial, para o nosso e-mail revistafabulas[arroba]gmail.com. Agradecemos desde já a colaboração.

Leitura através de tablets com as crianças conta como hora do conto?

por Catarina Araújo

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É a pergunta feita pelo jornal The New York Times num artigo que questiona se ler no iPad ou num tablet vale o mesmo que ler um livro ou será como ver televisão?

Pediatras, educadores e especialistas recomendam aos pais que comecem a ler livros com os seus filhos mesmo quando ainda são bebés. Contudo, com o crescimento do mercado dos dispositivos eletrónicos, e com novos e-books e aplicações de leitura infantis a serem lançados a toda a hora, são cada vez mais os pais que adotam os tablets como suporte de leitura.

A experiência de ler através de um ecrã é deveras diferente daquela de ler um livro encadernado. Como é que isso afeta o modo como a criança processa e apreende a informação?

Alguns estudos concluem que «elimina uma certa dinâmica que conduz ao desenvolvimento da linguagem». A interação que ler um livro promove com o virar da página, o apontar para os bonecos, aprender os sons com os pais, falar sobre a história, perde-se quando o dispositivo eletrónico faz isso tudo por eles. Será também mais fácil a criança distrair-se, não estar tão empenhada, quando pode carregar em tantos botões diferentes, sem se concentrar verdadeiramente em cada página.

O artigo aponta para um estudo feito em 2013 com crianças entre os três e os cinco anos cujos pais costumam ler e-books com elas e em que verificaram que essas crianças tinham mais dificuldades de compreensão do que aquelas que liam livros encadernados com o pai ou a mãe. Por outro lado, outros estudos demonstram que as crianças aprendem as palavras mais depressa através de um dispositivo eletrónico do que de maneira tradicional. Pode-se inferir daqui que embora favoreçam efetivamente a apreensão de vocabulário em quantidade, no que diz respeito à qualidade da aprendizagem não serão tão eficazes, muito pelo contrário.

O ideal seria portanto uma conjugação dos dois: favorecer a leitura de livros tradicionais, mas complementar com leitura através de tablets à medida que a criança for crescendo, tendo em conta as vantagens e desvantagens de cada suporte, pelo menos enquanto não se encontrar um consenso quanto à utilização de dispositivos eletrónicos com crianças.

Há uns meses a revista Visão, se não me engano, publicou uma reportagem sobre este tema, mas infelizmente não consegui encontrá-la. O artigo completo do The New York Times pode ser lido aqui.

Um espírito gentil preso no olhar grotesco da vida

por Catarina Araújo
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«Wonder», o título em inglês deste livro de R. J. Palacio, significa maravilha, ou na sua forma verbal, admirar-se, surpreender-se, sentir curiosidade. «Wonder» é uma daquelas palavras que, tal como «saudade», contêm nelas muito mais do que aquilo que significam objetivamente. Talvez por isso a editora decidiu-se por «Milagre» como título para a edição portuguesa. O que ainda assim, não sei se exprimirá com verdadeira justiça o otimismo, a esperança, o maravilhamento que a história nos transmite.

Auggie tem dez anos e está prestes a entrar numa escola nova. Como todas as crianças tem medo do que vai encontrar – novos professores, novos colegas, novas disciplinas, novas regras. Ainda para mais porque sempre estudou em casa, com a mãe. Porém, o desafio que está prestes a enfrentar é muito mais complicado do que à partida seria já que ele nasceu com uma deformação grave no rosto e teve de ser sujeito a inúmeras cirurgias para lhe permitir respirar normalmente, falar e comer.

Consciente do seu aspeto e de como as outras pessoas o veem à superfície, Auggie partilha com o leitor os seus medos, as suas dificuldades, com um humor, uma candura e uma franqueza desarmantes. Não há aqui lugar a condescendências, nem cinismos. As coisas são como são e ele sabe disso. Considera-se um miúdo normal – gosta de comer gelados, andar de bicicleta, jogar à bola e com a Xbox, além de ser um grande fã de A Guerra das Estrelas, só que com uma cara que leva «outros miúdos normais a fugir do parque infantil, aos gritos». Ele tem uns pais e uma irmã que o adoram, que o protegem, enchem-no de amor e carinho, mas sabe também que a irmã, Via, não o vê como um miúdo normal, caso contrário não sentiria necessidade de o proteger tanto, como ele próprio nos conta. No entanto, não se sente paralisado por isso, não deixa de se divertir, e se ao princípio se mostra muito relutante em ir para a escola nova, depois fica determinado em frequentá-la. Contudo, e tal como se esperava, não é fácil. Os miúdos são espontâneos, reagem à flor da pele, e alguns comportam-se de maneira diferente quando não estão ao pé dos pais ou de figuras de autoridade. Isso é uma coisa que Auggie aprende rapidamente.

A surpresa aqui é o facto de termos não só o ponto de vista de Auggie, mas também o de outras personagens importantes, como de Via, a irmã, e dos novos colegas de escola, como Summer, Jack Will, e até do namorado da irmã, Justin, e a melhor amiga dela, Miranda, cada um com a sua perspetiva sobre Auggie e a sua vida, visível até na sua escrita. É encantador verificar como ele toca cada um deles de uma maneira muito específica. Mais uma vez com uma franqueza brutal, sem floreados onde eles não existem. Há sentimentos de repulsa, de inveja, de dor, de vingança, há traições, há arrependimentos. Graças ao amor dos pais e da irmã, porém, Auggie é um rapaz muito bem resolvido e que aos poucos vai conquistando as pessoas ao seu redor. É claro que nem todas conseguem ultrapassar a deformidade do seu rosto e encontrar por detrás dela o miúdo normal com que todos nos identificamos e por quem nos apaixonamos perdidamente. Vivemos no mundo real e o desta história é tão real quanto possível.

Uma história desafiante, que nos obriga a pensar como reagiríamos se estivéssemos na pele de Auggie ou de alguém que o conhece, que nos desarma e que no fim nos deixa absorvidos em sentimentos de compaixão, esperança e otimismo, face à crueza da vida. E de como pequenos gestos de gentileza podem ter um efeito tão grande em nós e nos outros.

Deixo apenas uma pequena crítica a algumas gralhas e falhas de tradução, bem como ao formato adotado que é demasiado grande para uma criança, e este livro deve ser dado a ler às crianças.

Para quem estiver interessado em conhecer um pouco mais do contexto desta história, pode ler uma entrevista muito interessante que a autora R. J. Palacio deu ao The Guardian.