Transformar o medo em palavras e em atos de coragem

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por Catarina Araújo

A Gailivro tem uma coleção chamada «O mundo à minha volta», que reúne histórias de autores portugueses sobre os mais variados temas, desde a segurança ferroviária, à tolerância, à descriminação, e à importância de se ter bons hábitos alimentares. Uma questão de azul-escuro, de Margarida Fonseca Santos e ilustrado por Sandra Serra, aborda o tema do bullying.

O livro lê-se de um trago e é perfeito para leitura em conjunto entre pais e filhos. Também pode ser lido em situação de sala de aula de primeiro ciclo, mas só se for num contexto de grande proximidade, em que as crianças estejam à vontade, sentadas em almofadas no chão e a professora ou educadora no meio delas, pois é um assunto delicado que requer bastante tato, sensibilidade e, claro, bom senso.

A história passa-se numa aula de Educação Física em que, depois do exercício, a professora Susana sugere a todos os alunos que tirem a roupa em excesso, pois está muito calor. Luís usa um fato de treino demasiado quente para a época e mesmo assim recusa-se a tirá-lo. A professora estranha aquela atitude e tenta ajudá-lo, mas logo percebe que qualquer coisa se passa. Acha-o triste e com medo. Quando lhe tira a camisola verifica porquê: Luís tem manchas azuis escuras nos braços. Nódoas negras, frescas, bem recentes.

Em vez de o encher de perguntas como se de um interrogatório se tratasse, a professora Susana convida-o a sentar-se à sombra, calmamente, enquanto as outras crianças são encaminhadas para as aulas.

Num ambiente sossegado, com muita paciência e atenção, a professora conta a Luís uma história com que ele se identifica e isso ajuda-o a contar por sua vez à professora o que lhe aconteceu, como fez aquelas nódoas negras. Ficamos pois a saber que Luís foi vítima de bullying. Uns rapazes mais velhos agrediram-no na rua com violência.

A professora Susana envolve depois os pais e os colegas da turma na conversa, com a ajuda de um agende da Escola Segura. É nessa conversa, na sala de aula, que a professora se apercebe de que há mais crianças a serem vítimas dos jovens que agrediram Luís. O importante é o diálogo que se desenvolve, apesar do medo de represálias. Os adultos asseguram um ambiente estável, respondem às dúvidas, confortam-nos dizendo-lhes que é perfeitamente normal tudo aquilo que sentem. Aproveitam também para despertar nelas a consciência social. Ao ser-lhes dada a oportunidade de pensarem e de debaterem umas com as outras, as crianças chegam a uma conclusão: é necessário denunciar a violência para que não aconteça o mesmo a outras pessoas. A professora desafia-as a encontrar soluções para se prevenir aquele tipo de situações. Juntos pensam em frases para um folheto a ser distribuído na escola.

Uma maneira muito construtiva de abordar este tema tão difícil como complexo. É um livro que pode ajudar adultos e crianças a lidarem com este tipo de casos, estejam eles no lugar das vítimas ou no das testemunhas.

Seria interessante pensar também num livro sobre o agressor para esta coleção da Gailivro. Porque a maior parte das vezes os agressores, aqueles que praticam o bullying, também são vítimas de violência, física e/ou psicológica, e a sua vilificação não permite talvez que recebam a ajuda de que precisam para se reabilitarem. A questão é por certo complicada, mas seria uma maneira de expor os dois lados da história, pois nem tudo é preto e branco, e as crianças também devem aprender isso.

Outros títulos da coleção:
A Melhor Condutora do Mundo, de António Mota
O Meu Amigo Zeca Tum-Tum, de José Fanha
A Árvore dos Rebuçados, de Rosário Alçada Araújo
Querer, Ser, Ter, Poder, Dever: O Que Fazer?, Ana Nobre de Gusmão
A Pior Amiga, Fernando Carvalho

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